Primeiro capítulo do meu livro.
(que um dia vou acabar, prometo)
Capítulo 1
As reuniões noturnas
Cabelinho era um menino igual a todos daquele povoado, se não fosse pela característica que o levara a ter aquele apelido: um cabelo enroladinho. Mas ele não gostava de ser diferente. Deixava o cabelo crescer apenas por manha, e quando a mãe pedia para cortá-lo, Cabelinho logo escapulia de casa e só voltava quando a mãe estava entretida assistindo a novela da noite.
Fora isso, ele era um garoto como os outros. Ia à escola, à tarde jogava bola de gude na praça e à noite se reunia com os amigos para jogar conversa fora.
Eram nessas reuniões que Cabelinho contava aos seus amigos as histórias que seu avô contava em casa. Histórias essas que deixavam o cabelo de qualquer um de pé. Principalmente o dele.
Nessa noite, ele estava acabando de contar mais uma de suas histórias.
—... aí de repente ele sumiu do nada. Doidice, meu fio. Mas meu avô disse que viu o bicho fugindo.
— É... minha tia viu esse bicho rodando o quintal dela uma noite aí — disse o primo de Cabelinho, João.
— Pior é que ninguém viu esse bicho direito ainda. — disse Márcio, amigo de Cabelinho.
— Oxe, eu é que não quero ver mesmo. — Falou Mara, outra amiga de Cabelinho.
— Sabe, outro dia meu avô botou comida pros cachorros, mas no outro dia a comida tinha acabado e os cachorros tinham apanhado. Mas meu avô ficou sem entender o que aconteceu.
A cabeça de todos na roda agora funcionava a mil, imaginando o que acontecera com os cachorros do avô de Cabelinho e o que era esse bicho, afinal de contas.
Era tarde da noite e algumas mães já colocavam a cabeça do lado de fora da janela e gritavam pelos nomes dos seus filhos. Uma a uma, cada criança voltou pra sua casa até que restaram apenas Cabelinho, Márcio e Mara.
— Eu já vou indo também, minha mãe já deve ta me procurando essa hora — falou Mara —, amanhã você conta pra gente o resto da história. Se bem que eu acho que eu não quero ouvir.
— Deixa de ser medrosa Mara, esse bicho, ou seja lá o que for, não existe, deve ser invenção do Cabelinho. — falou Márcio, com cara de quem não liga muito.
— Você ta chamando meu avô de mentiroso, é? — disse Cabelinho enfurecido.
— Ok, rapazes, não briguem. — disse Mara separando os dois amigos — Cabelinho, eu acredito em você e no seu avô e morro de medo dessas histórias. Márcio só tem que passar por uma experiência de medo para saber que isso tudo é verdade. Não é Márcio? — disse ela olhando para Márcio pelo canto dos olhos.
— É. Tá. Desculpe Cabelinho. Mas fica difícil de acreditar em algo que eu não vi. Só ouço histórias.
— Eu sei que é difícil de acreditar. Mas eu sei que existe. Tem que existir.
Cabelinho disse isso olhando a lua, enquanto os amigos se afastavam. Ele acreditava nas histórias do avô, mas gostaria ele mesmo de ver o tal bicho e poder contar para os amigos suas experiências próprias.
Enquanto pensava nessas coisas, foi caminhando pelo mato, beirando a plantação de mandioca do avô, com um galho na mão, fazendo balançar as folhas das mandioqueiras. Ele simplesmente não sabia que alguns de seus desejos se tornariam realidade naqueles dias que viriam.
E tudo começaria quando ele passasse por aqueles olhos vermelhos que o espreitavam por trás da última mandioqueira.